Praça Dr. Jorge, Lavras - MG: A
Salvaguarda do Patrimônio Paisagístico
RESUMO
O rápido processo de urbanização
tem provocado um crescimento desordenado das cidades, com a consequente
supressão de áreas verdes potencialmente aptas ao estabelecimento de parques e
jardins. Os espaços públicos urbanos, e em particular as Praças Públicas,
constituem elementos importantes para a caracterização formal das cidades.
As praças públicas, além de contribuírem para o embelezamento das cidades,
também desempenham uma função importante no contexto urbanístico ambiental.
Dentre as praças de Lavras, a Praça Dr. Jorge se destaca por seu considerável
valor histórico. Pesquisando artigos de jornais da década de 1930, e
documentação fotográfica de época, desvendou-se que essa praça teve seu início
em 1899, e que sua primeira arborização foi com Paineiras (Chorisia speciosa). Constatou-se ainda que a praça era muito
utilizada pelos estudantes e pela sociedade dessa época, abrigando festas
comemorativas e encontros políticos de grande relevância para o município, pois
este logradouro se encontra anexo à Escola Municipal Álvaro Botelho tombada
pelo Conselho Municipal do Patrimônio Cultural em 23 de março de 2006 pelo
Decreto nº 6.671 em função do expressivo valor histórico e arquitetônico.
Atualmente a Praça Dr. Jorge, é um espaço bastante frequentado pela população e
também utilizada semanalmente para o comércio de feira livre. Em 1961 a praça foi totalmente revitalizada e
foi realizada uma abertura na parte inferior sentido norte visando maior
segurança e melhoria no tráfego de veículos. Possui atualmente uma área total
de 2.347,86 m² .
Hoje em dia e praça não conta mais com o glamour desse período do início do
século XX, mas ainda é extremamente importante, pois está localizada na região
nobre da cidade. O resgate histórico da referida praça é de fundamental
importância tanto para população lavrense quanto para a pesquisa da arte dos
jardins, pois este esclarece a evolução desse logradouro, servindo de
referência para futuras considerações da história dos jardins. Um dos objetivos
dessa análise histórica da evolução da Praça Dr. Jorge da cidade de Lavras –
MG, foi evocar sua utilização e os benefícios gerados para seus usuários, sendo
esse um trabalho importante e inédito na história das praças do município. Desde seus primórdios até os dias atuais,
este espaço público passou por algumas inexpressivas modificações em seu
traçado, entretanto a sua vegetação foi visivelmente alterada. Atualmente
encontramos uma magnífica árvore conhecida por tipuana (Tipuana tipu) bem como diversas espécie de ipês. Constatou-se
também por meio de pesquisas, que embora seja uma praça de grande destaque para
o município, não existem dados concretos e relatos sobre a mesma.
Palavras chaves: Praças públicas. Jardins Históricos. Paisagismo.
Arborização Urbana.
[1] Pós doutoranda da Universidade Federal de
Lavras/UFLA e Vice Presidente do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural de
Lavras /MG e Empresária/Ravenala
Paisagismo e-mail: alepaisagismo@gmail.com ;
2 Dr. Pesquisador do CNPQ e Prof. Departamento
de Ciências Florestais/UFLA e-mail: venturim@dae.ufla.br;
3 Vice-Presidente
do Instituto Sustentare: e-mail: marcus.passos@grupoengecop.com.br.
ABSTRACT
Fast urbanization process has caused a
disorderly growth of the cities, with the consequent suppression of green areas
potentially apt for the establishment of parks and gardens. Public urban spaces
and, in particular, Public Squares, constitute important elements for the
formal characterization of the cities. In addition to contributing in
beautifying the cities, public squares have an important role in the
environmental urban context. Among the squares in the municipality of Lavras,
Minas Gerais, Brazil, Dr. Jorge Square is highlighted due to its considerable
historic value. Researching articles from newspapers from the 1930’s, and
photographic documentations of the time, we verified that this square
originated in 1899, and its first trees were Paineiras (Chorisia speciosa). We also verified that the square was widely
used by students and by the society of
this time, housing commemorative festivities and political encounters of great
relevance to the municipality, given that this area is annex to the Escola
Municipal Álvaro Botelho, declared Cultural Patrimony by the Municipal Council
in March 23rd of 2006, by Decree no 6,671, in function of
the expressive historical and architectural value. Currently, the Dr. Jorge
Square is an area widely frequented by the population, and weekly used for street
market. In 1961, the square was completely revitalized, opening its inferior
portion to increase security and to improve vehicle traffic. The current total
area is of 2,347.86 m2. Today, the square no longer counts on the
glamour from the period of early XX century, but is still very important for
its location in the noble region of the municipality. The historical recovering
of this square is of fundamental importance for the population and for
researching garden art, for it clarifies the evolution of this area,
referencing future considerations of the history of the gardens. One of the
objectives of this historical analysis of the Dr. Jorge Square´s evolution was
to invoke its use and the benefits generated by its users, being considered an
important and innovative work of the histories of the squares in this
municipality. Since its beginning to current days, this public space has
undergone inexpressive changes in its layout. However, its vegetation was
visibly altered. Currently, we find a magnificent tree known as tipuana (Tipuana tipu), as well as many species
of Ipê. By means of researches, we verified that, despite the square being
largely highlighted in the municipality, there are no concrete data or reports
on it.
Keywords:
Public squares. Historical gardens. Landscaping. Urban forestry.
1 INTRODUÇÃO
Os jardins são monumentos históricos em constante evolução, fato que os
diferem substancialmente dos bens arquitetônicos e os inserem nas metodologias
de interpretação e salvaguarda das paisagens naturais. O jardim é uma forma de
ordenamento de território que acompanha o homem a tempos imemoriais, demonstram
também forma de expressão do entendimento humano da natureza, com investimento
na recriação do sonho do microcosmo perfeito.
Os centros urbanos têm grande dificuldade de atender as demandas da
comunidade, apresentando diversos níveis de inadequação, obsolescência e
degradação. Os espaços públicos centrais, principalmente os ‘verdes’ necessitam
ser revalorizados, através de diversas ações públicas, para desempenhar o seu
papel na comunidade local, desde o de imagem unitária de pertencimento da
comunidade até o de amenidade entre outros, que preservam a boa qualidade do
ambiente construído para seus usuários mais diversos.
A praça é, com certeza, um
dos espaços urbanos mais visíveis e, por isso, extremamente sensíveis às
transformações por parte do Poder Público. Assim, com o grande crescimento da
cidade de Lavras nos últimos 30 anos, e em consequência do desenvolvimento sócio
econômico, o processo de expansão urbana e a verticalização das edificações vêm
transformando o patrimônio histórico, ambiental e as paisagens desta cidade.
Embora se tenha alguns relatos
sobre a história da Praça Dr. Jorge, pouco se conhece sobre a evolução e as
transformações, haja vista que este espaço público se tornou referência, pois,
está localizado defronte à Escola Instituto Presbiteriano Gammon, que foi marco
histórico para a origem de umas das mais conceituadas universidades do país, a
Universidade Federal de Lavras/UFLA. Portanto, considerando-se a importância
sócio cultural e também ambiental deste espaço público, esta pesquisa
objetivou-se avaliar aspectos históricos e paisagísticos da referida área verde
urbana fornecendo também suporte para pesquisas acadêmicas e referências para
educação patrimonial.
2 REFERENCIAL TEÓRICO
No curso da história, diversas sociedades adotaram a prática de integrar
os aspectos naturais aos espaços de povoamento, levando a criação de espaços
naturais protegidos. Tais áreas verdes tinham, um primeiro momento, funções
voltadas para estética e o lazer, visando à contemplação da natureza e o
embelezamento das cidades renascentistas nos séculos XVII e XVIII a partir do
fortalecimento da classe burguesa, que dispunha de recursos financeiros e tempo
para o melhoramento das cidades. Entre o final do século XVIII e início do XIX
os jardins inserem-se em projetos urbanísticos urbanos para o recreio e
encontro da população, período também do surgimento e estabelecimento dos hortos
ou jardins botânicos com fins de aclimatação de espécies vegetais (Silva & Carvalho,
2013).
A palavra paisagem surgiu pela primeira vez no século XVI, na Holanda,
para designar uma pintura. Assim, este conceito é de origem artística, o que
demanda uma apreciação estética. Atualmente a paisagem é geralmente
interpretada como meio ambiente, um conceito de origem ecológica, que
caracteriza um espaço de terreno que se abrange num lance de vista. É uma
combinação entre a natureza, as técnicas e a cultura dos homens. A paisagem é
mutante e só pode ser apreendida na sua dinâmica, como relata (Grimal, 1972).
O pensamento ecológico modificou
a maneira de o homem pensar e perceber o meio ambiente, mesmo o urbano. Desde
uma atitude denunciativa até uma atitude politicamente correta, o caminho
trilhado só veio favorecer a percepção paisagística. Assim, a paisagem dentro
de um conceito mais moderno passa a ser avaliada como uma interação de fatores
envolvendo os valores ecológicos para uma qualidade de vida, tendo o homem como
o elemento mais importante (Paiva & Gonçalves, 2002).
Segundo
Clifford (1970), quadros representando lugares pitorescos, exóticos e
acolhedores são “paisagens”. A geografia tem para ela várias definições, mas
sempre procurando enxergá-la como o resultado atual de um longo processo
evolutivo; a formação do relevo de uma determinada região, seu clima e vida que
ali se instala e também evoluiu, à interferência humana e principalmente, como
tudo isso se inter-relaciona. Relata também o autor, que estas definições se
aproximam muito do que também é chamado “meio ambiente”. E então, tudo passa a
ser paisagem, ganhando vários nomes: paisagem urbana, rural, natural, litorânea
ou ainda, hostil, degradada, poluída.
Segundo
Segawa (1996), os jardins e os parques públicos constituem criações marcantes
na urbanização europeia a partir do século XVI, não negam em sua formulação
esse envolvimento mitológico e estético com a natureza. Por ora, buscamos
situar apenas a articulação cultural/natureza e o ponto de inflexão onde o
jardim deixa de ser uma metonímia para se tornar uma metáfora da natureza.
Ao longo do
processo histórico, os jardins sofreram transformações que podem ser
caracterizadas pelos estilos próprios de cada época e cultura. A palavra
“estilo” se originou no mundo greco-romano. Hoje compreendemos estilo como um conjunto
de qualidades próprias às produções do espírito, inspirado por um pensamento
geral comum que torna possível identificar e caracterizar suas
particularidades, (Forestier, 1985).
Conforme
relata Clifford (1970), Egito, Babilônia e Pérsia foram os locais das mais
antigas civilizações conhecidas, e são no geral regiões áridas. Num clima
quente e seco, sombra e água fresca são tudo o que se quer, e assim os
primeiros jardins incluíam tanques, canais de irrigação e árvores para sombra.
O desenho e as plantas utilizadas tinham a agricultura como referência; árvores
frutíferas, condimentos, plantas de uso ritual e muita linha reta.
Segundo Le
Dantec (1996), no período do Renascimento, houve um aumento de prosperidade em
todos os sentidos, provocando também um surgimento de curiosidades sobre o
mundo natural e, por coincidência, aumentou o interesse em se compor formas
harmoniosas para o jardim. Também
segundo relata o autor, que a França seria a responsável pelos maiores jardins
formais que o mundo conheceu, como por exemplo, o jardim do Castelo de
Versailles.
Na segunda
metade do século XVII surge nitidamente o estilo inglês, com suaves paisagens
em oposição ao francês. Os ingleses passaram a ser diferentes de outros povos
europeus neste aspecto, simplesmente por se identificarem com a “natureza”, e
muitos princípios modernos em paisagismo, surgiram já naquela época, como as
cercas-vivas. Passam a predominar as linhas curvas e as irregularidades das
paisagens são mantidas (Camargo, 2002).
Conforme
Clifford (1970), desde o século XVIII havia uma crescente popularização do
estilo de ciências naturais, e o reflexo disso tudo foi uma mudança de atitude
em relação à paisagem. Muitos princípios modernos em paisagismo, como
cercas-vivas arbóreas e mistas, já eram defendidos nessa época. A poda
escultural, ou topiaria saiu de moda por volta de 1710. Consoante também relata
o autor, o surgimento do “Landscape Garden”, ou jardim paisagístico, onde os
modelos estéticos passam a se inspirar na observação direta da natureza e nos
princípios da pintura.
A
intervenção minimizada na feição do terreno entre a área tratada e o seu
entorno, e o aproveitamento máximo das possibilidades cênicas do local,
permitem um aspecto causal ao tratamento paisagístico. O que é irregular e natural
passa a ser identificado com a pureza e a honestidade; assim predominam as
linhas curvas, e mesmo os canteiros muitos coloridos passam a ser evitados
(Monteiro, 2005).
Segundo
Vilas Boas (1999), uma das mais interessantes áreas também invadidas pelo espírito
romântico, a partir do século XVIII, foram a concepção e elaboração de jardins,
que ficaram conhecidos por seus contemporâneos como jardins paisagistas ou
jardins ingleses, por ter sido na Inglaterra onde primeiro fora concebido,
sendo que seus primeiros patrocinadores e construtores foram membros da
burguesia inglesa, identificados como uma nova concepção de mundo. Os conceitos
do jardim romântico na Inglaterra surgem em contraposição àqueles adotados pelo
jardim francês, cuja geometrização exprime com exatidão a visão racionalista
que o criou.
No Brasil,
os trabalhos de paisagismo têm longa tradição, tendo suas origens no final do
século XVII com o projeto do Passeio Público do Rio de Janeiro – RJ. Localizado
no Centro histórico do Rio de Janeiro, entre a Lapa e a Cinelândia, o Passeio
Público foi o primeiro parque ajardinado do Brasil e das Américas, ou seja, foi
a primeira área urbanizada do Rio de Janeiro, e foi concebida por um dos
maiores artistas do período colonial brasileiro: Mestre Valentim da Fonseca e
Silva. O artista desenhou um parque em estilo francês, com ruas em linhas retas
formando desenhos geométricos de tamanhos diversos (Vilas Boas, 1999).
O principal
paisagista do Império foi o francês Auguste François Marie Glaziou, que foi chamado
por Dom Pedro II para trabalhar no país em 1858 e aqui projetou espaços
públicos como os parques da Corte, entre o da Quinta da Boa Vista, o de São
Cristóvão, o do Palácio de Verão de Petrópolis, o do Barão de Nova Friburgo em
Nova Friburgo, o Parque São Clemente, e ainda a requalificação do Passeio
Público (Delphim, 2005).
Conforme
Leão (2002), o período moderno tem início com os projetos de Roberto Burle
Marx, e até hoje a maioria dos projetos segue seus paradigmas, como o uso da
vegetação nativa e o total rompimento com as escolas clássicas.
2.3 Praças históricas
A praça, juntamente com a rua, consiste em um dos dois mais importantes
espaços públicos urbanos da história no país, tendo, desde os primeiros tempos
da Colônia, desempenhando um papel fundamental no contexto das relações sociais
em desenvolvimento. A praça é, portanto, um centro, um ponto de convergência da
população, onde são realizados encontros românticos ou políticos, enfim, para o
desempenho da vida urbana ao ar livre, relatam (Roba & Macedo, 2003).
Segundo Rigotti (1956), citado por Angelis Neto (2003), do romantismo à
praticidade, conceitos e funções sobre as praças existem os mais diversos;
porém, todos têm um ponto em comum: é o local de reuniões e encontros. As
praças são locais onde o povo se reúne para fins comerciais, políticos, sociais
ou religiosos, ou ainda, onde se desenvolvem atividades de entretenimento.
Somente no final do século XVIII é que no Brasil a tentativa de
reaproximar-se do meio ambiente, os jardins foram adaptados em
particularidades, buscando assim estimular a sensibilidade à paisagem. Esta
preocupação levará à integração dos elementos da flora no próprio traçado da
cidade, como reação e ao mesmo tempo solução ao problema do adensamento urbano
(Angelis Neto, 2003).
3 RESULTADOS
3.1 História de Lavras
Falar da história de Lavras sem representar os acontecimentos que levaram
o movimento conhecido como banteirantismo
e a descoberta das Minas do Ouro, e
suas próprias convulsões históricas, estaríamos nos apropriando indevidamente
dos preceitos a que convêm distinguir a narração dos fatos sociais, políticos e
econômicos, atribuídos à formação e ao desenvolvimento de qualquer município
das Gerais, principalmente daqueles que se difundiram nas rotas das bandeiras e
nos caminhos do ouro. A partir de 15 de janeiro de 1737, Lavras começa a
povoar-se, dando livre curso às suas tendências sócio econômicas e culturais,
associado às novas famílias, Bueno da
Fonseca, que organizaram domicílios e consagraram a Nova Capela invocada à
Sant´Ana, determinando assim, a condição elevada de vida e a entrada no novo
tempo com os Campos de Sant´Ana das
Lavras do funil. O nome “Lavras” vem
de lavrar em busca do metal precioso. O povoado foi transformado em município
em 13 de outubro de 1831. Em 20 de julho
de 1868, obteve-se a sua emancipação política e administrativa. O município de
Lavras - MG teve um grande desenvolvimento na década compreendida entre 1907 e
1917, quando os lavrenses investiram na cidade promovendo melhoramentos de
grande expressão para a época (Histórico de Lavras, 2002).
Lavras construiu sua identidade a partir de camadas de memórias,
histórias e culturas que chegaram de vários locais e, ancoradas no ciclo do
ouro, somaram um passado histórico que configuraram uma cultura política que se
tornou marcante e definida. Nessas circunstâncias, a política e principalmente
a cultura ganham no município um espaço estratégico. (Vilela, 2007)
3.2 Praça Dr. Jorge: primórdios e evolução
A Praça Dr. Jorge, é um dos marcos mais antigos da cidade de Lavras,
assim denominada em homenagem à memória do notável mineiro Dr. José Jorge da
Silva (nasceu em 1810 e faleceu em 1880), residiu em Lavras por muitos anos e
também foi deputado provincial de 1835 a 1837, sendo reeleito em 1838 a 1839.
Registros da década de 1920 relatam que a praça teve seu início em 1899, pois
nesta época o espaço já fazia parte do povoado (Soares, 1959).
FIGURA
1 - Vista parcial da praça Dr. Jorge com as paineiras Arquivo:
Coletânea Renato Libeck.
Conforme registro da década de 1930, a praça era um local arborizado com
a espécie (Chorisia sp) conhecida
popularmente por paineira, uma espécie de grande porte distribuída em fileiras
duplas. Com relação à vegetação arbustiva, não se registrou a distribuição na
mesma. As imagens registram também os casarios à direita e também do lado
esquerdo. A praça não aprestava calçamento e possuía uma declividade natural
acompanhando as ruas adjacentes, que se mantém até os dias atuais. Em um jornal
local, registrou o desastroso efeito das chuvas na praça e ruas adjacentes,
pela falta de pavimentação nestes locais, as ruas eram apenas cascalhadas,
constatou-se o alinhamento inadequado da praça bem como suas sarjetas
defeituosas, sendo estes os responsáveis pelos problemas ocorridos Fato este
lamentado pelo jornal Nova Lavras, em matéria publicada em 30 de abril de 1933,
com transcrição na íntegra:
[...] como esta rua da praça, muitas ruas sofrem os
danos causados pelas chuvas, tão desejáveis para apagar a poeira, mas tão
prejudiciaes á conservação dos cascalhos, uma vez que não possuímos e nem
sabemos quando iremos possuir ruas calçadas, tão necessárias a cidades de
topographia como a nossa, que as chuvas lavam de cima a baixo, carregando, pelo
declive das ruas tudo que encontra e pode carregar [...].
Observa-se na Figura 1 a linha do bonde, pois este era um meio de
transporte muito importante e circulava na cidade, passando ao lado da praça
pelo lado direito no sentido norte sul. O bonde foi inaugurado em 21 de outubro
de 1911 e fizeram história para o povo lavrense, muitas recordações e
lembranças estão na memória daqueles que viveram na era bonde. Foi uma
iniciativa do ex-presidente da Câmara Municipal e na época deputado, o conceituado
advogado Dr. Álvaro Botelho. Os casarios do lado direito, sentido norte sul,
também eram destaque bem como a conceituada Escola Municipal Álvaro Botelho. Existia
também nesta praça um lindo casarão da tradicional família Zagotta, construído
em 1922 e demolido em 2004.
A Figura 2 ilustra o espaço público sem as Paineiras, indicam
que as frondosas árvores foram cortadas entre as décadas de 1930 e 1940[1] provavelmente
em função da espécie ser de grande porte e talvez fora necessário para o
planejamento de uma nova vegetação dando à praça um aspecto diferenciado e
funcional.
[1] Informação pessoal: Ângelo Alberto de Moura
Delphim.
FIGURA
2 - Vista da Praça Dr. Jorge, década de 1930 Arquivo:
Museu Bi Moreira.
Conforme imagem acima, Figura 2, este espaço público não possuía
arborização e também não existia vegetação de porte baixo. Existia nesta época
apenas caminhos para a circulação de pedestres para todos os extremos da praça.
Registra-se a grande utilização do espaço público por alunos, pois está situado
nas adjacências da praça a Escola Estadual Álvaro Botelho. Observa-se também a
presença de crianças uniformizadas, assim pode-se inferir que sejam da Escola
situada ao lado. Percebe-se que o terreno é amplo e não apresentava ainda
delimitações de calçadas e canteiros, pois os transeuntes circulavam em
caminhos estreitos, conclui-se, portanto, que o terreno destinado à futura
praça ainda não apresentava um planejamento paisagístico. Observa-se também os
casarios descendo sentido zona norte. Aos fundos observa-se a chácara do
Colégio Instituto Presbiteriano Gammon.
FIGURA 3
- Vista parcial da Praça Dr. Jorge, ano 1945 Arquivo:
Coletânea Renato Libeck.
Esta imagem da Figura 3,
ilustra a magnífica praça pública contornada com a espécies (Ligustrum lucidum), conhecida
popularmente por Alfeneiro do Japão, sendo estes visivelmente bem cuidados com
técnicas de poda, conduzida por topiaria[1]. Possuía plantas arbustivas topiadas e também plantas
conhecidas por agaves. A praça apresentava canteiros quadriculados simétricos
em estilo clássico com linhas rígidas retilíneas.
As áreas de circulação ainda não possuíam pisos, portanto eram ainda de
terra ou provavelmente cascalho. Segundo depoimento das senhoras Joana e
Rosalina Zagota, proprietárias do casarão situado na extremidade sul da
praça... Existia uma fonte de água na
parte central e superior no jardim até com disputas pelo seu uso, pois sempre
havia falta de água na cidade” e
também havia um jardineiro de fora, de Belo Horizonte, que realizava a poda das
árvores”
[1] Topiaria,
vem do latim topiarus e significa a
arte de adornar os jardins, por meio
de transformação de plantas em
esculturas vivas dando-lhes formatos variados como figuras humanas, de animais,
de objetos e geométricas.
A praça possuía, na década de 1940, uma extensão ininterrupta até o muro
da chácara referenciada acima, desta forma a ligação entre as ruas laterais só
se efetuava próximo a entrada da chácara. Já na década de 1960, conforme se
visualiza na Figura 4, a praça apresentava totalmente revitalizada e com uma
passagem, sentido sul norte, que favoreceu o tráfego de veículos melhorando
assim a segurança. A mudança trouxe a separação da praça em duas partes,
através de um segmento de rua em diagonal. Observa-se que houve, por parte da
administração pública, a elaboração de um projeto paisagístico para este
logradouro. As árvores apresentavam desenvolvidas e existia também algumas
espécies de palmeiras no canteiro interno da praça. A praça era arejada e
ensolarada e já apresentava calçadas circundantes.
Na década de 1960, a praça já possuía árvores formadas, como o Alfeneiro
do Japão que circulava toda praça, nesta época os canteiros geométricos
topiados não eram mais destaques. O Bonde subia ao lado da praça e as ruas já
apresentam calçadas com paralelepípedos.
Foi plantada na década de 1960 uma espécie conhecida por tipuana (Tipuana tipu), atualmente esta espécie
faz parte deste logradouro, pois é uma magnífica e frondosa árvore, um cartão
postal da praça, considerada também uma árvore monumento, segundo (Bi Moreira,
1979).
Atualmente a Praça Dr. Jorge ocupa uma área de 2.347,82 m² e localiza-se
no coração da área central da cidade, junto às principais vias de acesso norte
sul [1]. Esta
área verde abriga espécies frondosas, principalmente ipês roxos, uma banca de
jornal, um ponto de taxi além de abrigar ainda uma feira livre semanalmente.
|
Figura 5: Vista da
Praça Dr. Jorge com Ipê roxo, 2009 Foto: Alessandra T.
Silva
4 CONCLUSÕES
A Praça Dr. Jorge é uma das
áreas verdes mais importantes, tanto do ponto de vista histórico quanto
paisagístico, pois está vinculada às origens da cidade devido à sua localização
sendo também umas das principais ilhas de conforto ambiental, pois a vegetação arbórea presente na paisagem gera uma
dominância induzida pelas formas e texturas das copas, bem como pelo porte. A
praça apresenta um designe em estilo clássico com linhas rígidas retilíneas.
Uma das formas de preservar e perpetuar essas memórias é através do
resgate histórico da praça, pois uma das funções ancestrais dos jardins, a de
lazer e recreio, constitui talvez um dos principais motivos e motivações para a
recuperação, salvaguarda e valorização deste patrimônio.
Após anos de descuido e degradação, o espaço público das cidades e áreas
metropolitanas brasileiras, demonstra sinais de maior preocupação por parte das
administrações municipais, que iniciaram processos de requalificação e
reestruturação.
O processo de evolução urbana e a falta de espaço na região central da cidade,
podem ocasionar mais redução de espaço deste patrimônio paisagístico e
histórico de Lavras, urge, portanto, a necessidade de uma medida protetiva
definitiva da Praça Dr. Jorge por meio se seu tombamento, responsabilizando o
poder público municipal na manutenção se seus elementos arquitetônicos e
paisagísticos.
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